Advertisement

Responsive Advertisement

Prisioneiras | Drauzio Varella



    Este não foi o meu primeiro contato com a obra do, provavelmente, médico mais famoso e respeitado no Brasil. Preciso começar explicando isso, para que se compreenda a minha pouca surpresa com a qualidade da obra em geral. Eu não esperava nada menos do que o que foi apresentado aqui, afinal, meu primeiro contato com seus escritos foi a leitura de Estação Carandiru, em 2019.

De todos os tormentos do cárcere, o abandono é o que mais aflige as detentas. Cumprem suas penas esquecidas pelos familiares, amigos, maridos, namorados e até pelos filhos. A sociedade é capaz de encarar com alguma complacência a prisão de um parente homem, mas a da mulher envergonha a família inteira.

    Dos aspectos técnicos, acredito que possamos chamar o Dr. Drauzio de cronista (e um dos bons!). O médico tem domínio de nossa língua e da estrutura narrativa como poucos literatas e divide conosco parte da sua vivência cotidiana atendendo no sistema carcerário do nosso país. O livro é divido em capítulos curtos que contam a história de personagens ou aspectos específicos das prisões femininas, mas que juntos, formam um panorama amplo o suficiente para conhecermos essa realidade que é tão alheia a vida da maior parte da classe média brasileira. Dados os devidos méritos as ferramentas do escritor, agora vamos ao conteúdo em si.

    Acredito que o maior mérito de Prisioneiras está na diversidade de temas que o livro concentra. Longe de "passar a mão na cabeça de bandido", como muitos acreditam que os defensores dos Direitos Humanos faça, aqui Drauzio se preocupa em nos mostrar as várias facetas de pessoas que, sim, cometeram crimes (alguns deles, inclusive, de revirar o estomago). Mas acredito que ai está a chave: ele se lembra a todo momento de que são pessoas. E que como pessoas, também possuem histórias de dor e de alegria.

    Em um primeiro momento, o autor se concentra em explicar aos leitores o espaço físico do carcere feminino em que atende. Longe da barbárie retratada em Carandiru (com celas superlotadas e condições precárias de higiene), mas tampouco perto de qualquer modelo ideal para acomodar seres humanos, a prisão feminina não oferece conforto, mas demonstra o cuidado empregado pelas próprias mulheres que passam grandes parcelas de sua vida ali.

    E assim como no primeiro volume desta série, Drauzio também explica o problema das drogas no sistema carcerário brasileiro, bem como o surgimento, a organização e a atuação do PCC (Primeiro Comando da Capital) na ausência cada vez maior de um Estado que regule de forma eficiente o cárcere. Mas para além das questões criminais, o médico também se desdobra sob as questões humanas, abordando a homossexualidade dentro das prisões femininas; a gravidez precoce nas periferias; a violência sexual e o abandono familiar.

    De modo geral, é um livro doloroso, que toca em feridas pessoais e sociais, mas que propõem reflexões importantes demais para serem deixadas de lado. E mesmo com assuntos tão sérios, em alguns momentos em histórias, não posso mentir, tive boas risadas. Somos humanos, afinal. E como brasileiros, estamos fadados a rir, as vezes, de nossas próprias desgraças.

Violência de gênero é flagelo que de uma forma ou de outra atinge todas as mulheres brasileiras, mas o ônus se concentra de maneira desproporcional entre as mais pobres e as negras, como constatam as estatísticas. É nas áreas periféricas das cidades que o despotismo masculino exibe sua face mais brutal.

    Drauzio Varella é médico oncologista, cientista e escritor. Ficou conhecido nacionalmente por popularizar a informação médica no Brasil, através de aparições em programas de rádio, TV e pela Internet. Atualmente, possui 13 obras publicadas.Sua série mais famosa conta sobre o período em que foi voluntário no sistema carcerário de São Paulo: Estação Carandiru, Carcereiros e Prisioneiras.


Comprando qualquer produto através dos links do Palavra Afetiva,
você não gasta nada a mais por isso, mas me ajuda com uma pequena
comissão para manter esse projeto de pé!


Postar um comentário

0 Comentários